domingo, 28 de maio de 2017

AMÉRICA, AMÉRICA


AMÉRICA, AMÉRICA (1963)

Principia-se por ouvir a voz de Elia Kazan: “O meu nome é Elia Kazan. Tenho sangue grego, sou turco por nascimento e americano porque o meu tio fez uma viagem”. E continua a narrativa: “Esta história foi-me contada pelos mais velhos da família. Eles recordavam a Anatólia, esse planalto no centro da Turquia. A Anatólia também é arménia e grega, mas há 500 anos os turcos conquistaram-na. A partir daí, houve conquistadores e conquistados”.
Assim se inicia “América, América”, filme obviamente autobiográfico, mas de um tipo de autobiografia coral. Não é só a vida de Elia Kazan que nos é contada, mas a de muitos e muitos emigrantes gregos, arménios, turcos, e de tantas outras origens que demandaram a América enquanto símbolo de uma terra prometida. 
Elia Kazan (Elias Kazanjoglou era o nome de baptismo) nasceu em Constantinopla, cidade então do Império Otomano (hoje Istambul, na Turquia), a 7 de Setembro de 1909. Mas foi grego o registo da sua nacionalidade, dado que os pais tinham essa origem. Aos quatro anos de idade, a família emigrou para Nova Iorque e leva-o consigo, perseguindo sonhos e quimeras que a América, terra das oportunidades, não deixava de criar nos pobres europeus do velho continente. Estabeleceram-se com um negócio de tapetes, e Elia começou os seus estudos em Nova Iorque, passando depois para a Mayfair School de New Rochelle, para onde os pais se mudaram, vindo a terminar o curso no Williams College, em 1930, prosseguindo depois uma especialização no Drama Department of Yale, dando assim vazão à sua paixão pelo teatro. 
Em 1932, é actor e assistente de encenação no Group Theatre, uma companhia teatral formada há muito pouco por Lee Strasberg e Harold Clurman. Por essa altura, na cena nova-iorquina, este grupo e o Federal Theatre, de Orson Welles e John Houseman, eram as companhias de vanguarda, destacando-se quer pelas suas ideias progressistas, radicadas nos ideais do “New Deal”, de Roosevelt, mas também nas ideologias socialistas e comunistas, muito em voga nessa época nos meios intelectuais norte-americanos, quer pelo arrojo formal da sua concepção cénica.
Como actor, Kazan interpreta personagens proletárias de obras de Clifford Odets, dedica-se a acções de empenhamento social, distribui propaganda e filia-se no Partido Comunista, onde permanece pouco tempo. Desse período de actor retêm-se as suas participações em peças de grandes autores norte-americanos, nomeadamente Clifford Odets. Durante este período de aprendizagem, foi decisivo o seu trabalho com encenadores como Lee Strasberg, Clifford Odets ou Harold Clurman. Pouco depois de se estrear como actor, e de passar por algumas outras tarefas, como director de cena e produtor, encena já algumas das peças que irão figurar no seu registo mítico e que o transformaram numa lenda viva, ao criar uma das mais vertiginosas e retumbantes carreiras teatrais de todos os tempos. 
Em 1947, cria o “Actor’s Studio” juntamente com Lee Strasberg, e com “All My Sons”, de Arthur MiIIer, uma produção Harold CIurman, EIia Kazan, WaIter Fried e Herbert H. Harris, no Coronet Theatre, inicia a sua época de ouro como encenador, continuada com “A Streetcar Named Desire”, de Tennessee Williams, que representa o triunfo do “Método”, criado pelo “Actor’s Studio”. 1948 fica marcado por “Sundown Beach”, de Bessie Breuer, e “Love Life”, de Alan Jay Lerner, 1949 é o ano de “Death of a Salesman”, de Arthur Miller.
“Flight Into Egypt”, de George Tabori (1952), “Camino Real”, de Tennessee Williams (1953), “Tea and Sympathy”, de Robert Anderson, “Cat on a Hot Tin Roof”, de Tennessee Williams (1955), “The Dark at the Top of the Stars”, de William Inge (1957), “J. R.”, de Archibald MacLeish (1958) e “Sweet Bird of Youth”, de Tennessee Williams (1959) são outros espectáculos memoráveis.
Em 1964, depois de um curto período de ausência dos palcos, Kazan regressa com as encenações de “After the Fall”, de Arthur Miller, “But For Whom Charlie”, de S. N. Behrmano e “The Changeling”, de Thomas Middleton e William Rowley, todas com produção do Repertory Theater of Lincoln Center no ANTA Washington Square Theatre. 
Durante grande parte desta carreira teatral, Kazan combinou este trabalho no palco com o de realizador de cinema. A sua derradeira colaboração com o teatro foi a co-direcção do Repertory Theatre of Lincoln Center for the Performing Arts, que teve a seu cargo entre 1963 e 1964, abandonando definitivamente os palcos depois disso. A sua actividade teatral permitiu-lhe dirigir directamente alguns dos maiores actores do teatro e do cinema norte-americanos, tais como Van Heflin, Lee J. Cobb, Frances Farmer, Will Lee, Ruth Gordon, E. G. Marshall, Montgomery Clift, Fredric March, Burl Ives, Barbara Bel Geddes, Jan SterIing, Ed BegIey, Arthur Kennedy, Karl Malden. MarIon Brando, Kim Hunter, Jessica Tandy, Martin Balsam, Julie Harris, Cloris Leachman, Arthur Kennedy, Zero Mostel, Paul Lukas, Jo Van Fleet, Frank Silvera, Eli Wallach, Deborah Kerr, Ben Gazzara, Pat Hingle, Teresa Wright, Chritopher Plummer, Raymond Massey, Paul Newman, Geraldine Page, Jason Robards, Faye Dunaway, Ralph Meeker, Hall Holbrook, Barry Primus, ou mesmo alguns cineastas que atravessaram períodos de carreira como actores, casos de Martin Ritt, Nicholas Ray, Lou Antonio, entre outros.
A partir de 1945, Kazan passa ao cinema, convidado pela 20th Century Fox para integrar a sua equipa de realizadores, numa altura em que os estúdios norte-americanos procuram avidamente novos talentos. Elia Kazan fora para Hollywood depois do Group Theatre fechar as portas. Em Hollywood, intervém como actor em duas películas de Anatole Litvak: “City for Conquest” (1940) e “Blues in the Night” (1941). Antes, porém, ainda bastante jovem, já havia colaborado numa comédia, ainda na década de 30, “Pie in the Sky” (1934) e tentado a realização com dois documentários institucionais, “The People of the Cumberlands” (1937), uma produção Frontier Films, e “It's Up To You” (1941), uma produção do Ministério da Agricultura.
Mas a estreia no filme de ficção dá-se precisamente em 1954, com “A Tree Grows in Brooklyn”, história de uma família de emigrantes irlandeses, aliás um dos temas que mais fortemente irá impregnar toda a filmografia deste autor, profundamente preocupado com a inserção social das suas personagens. Isso mesmo se irá confirmar nas suas realizações seguintes, “Boomerang” (1947), que aborda a justiça, os seus mecanismos e a possibilidades do erro judiciário, ou “Gentleman's Agreement” (1947), denunciando o racismo, neste caso o anti-semitismo. Será, todavia, em “Panic in the Streets” (1950), um “filme negro” invulgar que se irá impor como um nome incontornável na cinematografia norte americana dessa época. Posteriormente, em 1951, dirige Marlon Brando em “Um Eléctrico Chamado Desejo” (sua primeira adaptação teatral ao cinema) e “Viva Zapata!” e, posteriormente, em “Há Lodo no Cais” (1954). Por esta altura, numa época em que o Maccarthismo ameaçava a sociedade norte-americana, Kazan protagoniza um episódio chave da sua vida, denunciando companheiros de trabalho que pertenceram, como ele, ao Partido Comunista, publicando um anúncio onde confessava essas actividades, e depondo perante a Comissão das Actividades Anti-americanas. Esta sua atitude iria marcar todo o seu futuro, em particular a sua obra, que irá procurar justificar o seu comportamento. “Há Lodo no Cais” e “Viva Zapata!” são algumas dessas etapas.
Em “On the Waterfront”, escrito por Budd Schulberg, Kazan, através da personagem interpretada por Marlon Brando, tenta fazer perceber aos outros a lógica da sua denúncia, servindo-se de um caso de corrupção no ambiente do sindicalismo. O delator confronta-se com a sua consciência, mas um imperativo moral leva-o a denunciar (falsos) amigos e a pôr a claro a podridão que campeia numa organização mafiosa.
Em 1955, roda “A Leste do Paraíso” com um novo actor em quem deposita toda a confiança, voltando a acertar em cheio: James Dean brilhará para sempre como o retrato do jovem revoltado “sem causa”, que ainda sobrevive presentemente na mitologia mundial. “Esplendor na Relva” (1961), segundo John Steinbeck, é outra das suas obras assumidamente autobiográficas, até se chegar a “America, América” (1963), que fala directamente de si, da sua chegada à América e da sua família. Os seus últimos filmes são “O Compromisso” (1969), uma adaptação de um romance seu que é outro momento confessional, “Os Visitantes” (1972), uma obra experimental, com poucos recursos, percorrendo os caminhos imaginados pelo escritor Chris Kazan, seu filho, anunciando então a sua retirada também do cinema. Mas regressa com “O Último Magnate” (1979), dirigindo outro monstro sagrado, Robert De Niro, e onde empreende uma meditação sobre Hollywood e o cinema. 
Falando abertamente de “América, América”, esta obra inicia-se em 1896. Stavros Topouzoglou (Stathis Giallelis) é um jovem nascido na Anatólia, numa altura em que a região era dominada por turcos, muito embora ali vivessem gregos e arménios como povos subjugados. Com alguns anos de atraso, poderia bem ser o caso de Elia Kazan. Stavros vive desde há muito obcecado pela ideia de partir para a América, terra das grandes oportunidades. Caminhando pela terra inóspita da Anatólia, ao lado de um tio, vai-lhe perguntado se na América há montanhas tão grandes quanto aquelas, ao que o tio lhe responde: “Na América é tudo maior”. O sonho de Stavros transborda. Entretanto, um grupo de arménios assalta um banco em Constantinopla, a repressão turca recrudesce, os pais de Stavros enviam-no para a Constantinopla para junto de um familiar que vende tapetes (tal como os pais de Kazan). Mas Stavros não pensa em ficar, mas em partir. Atravessar os oceanos e descortinar no horizonte a Estátua da Liberdade. Até lá chegar, muito terá de penar, de sofrer, de não desistir a cada nova contrariedade, a cada embuste, a cada nova traição. A sua fé é tão grande que Stavros já é conhecido por “América, América”. 
O filme, rodado a preto e branco, com uma imagem contrastada de Haskell Wexler, é brilhante na criação de ambientes, no desenho das personagens, no desenrolar das situações, no rigor e na contensão que impõe aos sentimentos e às emoções. Nesse aspecto, a direcção artística de Gene Callahan é soberba na justeza, bem como a montagem nervosa de Dede Allen. A música de Manos Hatzidakis integra-se perfeitamente neste universo de uma claustrofobia contagiante, que só a fé desmedida de Stavros contraria. A sua esperança na chegada à América resiste, mesmo para lá da completa desilusão que é enfrentar uma realidade igualmente hostil e violenta, onde as desigualdades sociais e a aspereza das condições de sobrevivência não diferem muito das que conhecia na Anatólia. 
Este filme é uma memória viva, a consciencialização de uma realidade em confronto com os sonhos. A verdade é que Ela Kazan, o cineasta, triunfou na América e a sua história é um pouco a concretização de um sonho e a confirmação da América como a terra da esperança e das oportunidades. Mas por alguém que triunfa, quantos sonhos não esbarram no maior dos infortúnios? Kazan, agradecido à América, não deixa de apontar o olhar crítico a uma terra com tudo para ser também madrasta.  Resta dizer que os actores são brilhantes e que “América, América” demonstra, sem sombra para dúvidas, que aquela foi, e é, uma terra de emigrantes. 

AMÉRICA, AMÉRICA 
Título original: America America 
Realização: Elia Kazan (EUA, 1963); Argumento: Elia Kazan, segundo romance seu; Produção: Charles H. Maguire, Elia Kazan; Música: Manos Hatzidakis; Fotografia (p/b): Haskell Wexler; Montagem: Dede Allen; Design de produção: Gene Callahan; Direcção artística: Vassilis Photopoulos; Guarda-roupa: Anna Hill Johnstone; Maquilhagem: Eligio Trani; Som: Jean Bagley, Edward Beyer, Jack Fitzstephens, Le Roy Robbins, Dick Vorisek, Stanley Bixtel; Companhias de produção: Athena Enterprises, Warner Bros.;Intérpretes: Stathis Giallelis (Stavros Topouzoglou), Frank Wolff (Vartan Damadian), Harry Davis (Isaac Topouzoglou), Elena Karam (Vasso Topouzoglou), Estelle  (Avó Topouzoglou), Gregory Rozakis (Hohannes Gardashian), Lou Antonio (Osman), Salem  (Odysseus Topouzoglou), John Marley (Garabet), Joanna Frank (Vartuhi), Paul Mann (Aleko Sinnikoglou), Linda Marsh (Thomna Sinnikoglou), Robert H. Harris, Katharine Balfour, Giorgos Foundas, Tom Holland, Elia Kazan (voz), Dimitris Nikolaidis, Dimos Starenios, etc. Duração: 174 minutos; Distribuição em Portugal (DVD): inexistente; Edição vídeo em Portugal: Filmes Lusomundo (colecção Argos); Distribuição internacional (DVD): Regia Films (Espanha); Classificação etária: M/ 12 anos. Versão inglesa, com legendas em espanhol. 

terça-feira, 16 de maio de 2017

17 DE MAIO: 12 ANOS ESCRAVO



12 ANOS ESCRAVO (2013)

Arrisco-me a escrever que “12 Anos Escravo” é o melhor filme sobre a questão da escravatura que eu alguma vez vi. E vi muitos, e alguns muito bons. Mas esta obra de Steve McQueen (autor anterior de filmes magníficos, como “Fome” e “A Vergonha”) ultrapassa-os a todos. Vamos ver se consigo explicar o porquê desta minha conclusão, e o que me terá levado a ela.
Antes de tudo o mais, o argumento é de uma inteligência extrema, adaptando uma obra autobiográfica, “Twelve Years a Slave”, de Solomon Northup, obra surgida em 1853. A história, muito resumidamente, relata as desventuras de Solomon Northup (Chiwetel Ejiofor), um negro livre que vive desafogadamente em Nova Iorque, corre o ano de 1841. Solomon é homem instruído, culto, violoncelista, casado e pai de dois filhos. Um dia é aliciado para se juntar, durante algumas semanas, a dois artistas circenses, e parte pensando arrecadar alguns dólares extra com a tournée. Sem que nada o faça prever, é raptado em Washington e levado prisoneiro para os Estados do Sul, onde a escravatura era a base da economia rural, que tinha na apanha do algodão o seu maior tesouro e na mão-de-obra escrava a razão principal do seu excessivo lucro. Aí vai passando de dono em dono, até se ver instalado na propriedade de Edwin Epps (Michael Fassbender), um latifundiário sem escrúpulos, que o trata selvaticamente, tal como a todos os outros, incluindo a sua negra “protegida”, Patsey (Lupita Nyong'o). O pesadelo de Solomon Northup estende-se por uns longos doze anos, até que consegue ser resgatado por amigos do Norte que formalizam com documentos, junto às autoridades do Sul, a sua condição de homem livre.


Há desde logo um aspecto que torna este filme diferente da grande maioria de outros títulos onde a escravatura é abordada. Antes de ser escravo, Solomon Northup é um homem livre, gozando de todos os direitos e deveres de um cidadão como qualquer outro que, em 2013, está a ver o filme. Esta identificação é decisiva para o impacto da obra. Ela mostra o absurdo da escravatura, o arbitrário de alguém ser livre agora e escravo no momento seguinte, por um simples acto de pirataria, criminoso num Estado, legalizado num outro. (É conveniente ter-se em conta que o filme se passa num período anterior à Guerra da Secessão norte-americana, que se irá prolongar entre 1861 e 1865, opondo precisamente os Estados do Norte industrializado aos do Sul rural). Depois, existe um inquietante sentido de normalidade ao longo de todo o filme, a realidade presente de uma actividade consentida e instituída, onde o Mal impera sem necessidade de disfarces ou desculpas. Estamos no domínio do terrível absurdo, mas de um absurdo banalizado, normalizado.
Deve ainda sublinhar-se uma outra questão que julgo essencial na obra: Solomon Northup é um herói na forma como consegue sobreviver à sua tragédia pessoal, mas essa sobrevivência impõe-lhe regras e sujeições que o transformam não num herói, mas num anti-herói. Ele tem de esconder a sua cultura e a sua condição, não confessa aos seus “donos” que sabe ler, aceita ver açoitar uma mulher indefesa, vê morrer companheiros de desdita, atravessa quase sempre calado um calvário de brutalidade sem nome. Numa situação limite, ele é apenas humano: quer viver. Sobreviver. A 12 anos de escravatura.


Este aspecto liga-se ao que me parece o mais importante no filme de Steve McQueen, que é a forma escolhida pelo realizador para narrar a sua história. Não há qualquer transigência com o melodramático ou a demagogia emocional. A escrita é dura e enxuta, sem rodriguinhos, a câmara enquadra de forma justa e directa, num estilo seco e objectivo. A violência existe e explode mas o olhar é distante, não por desinteresse mas por respeito. O resultado é mais grave para o espectador que se confronta ele próprio com as imagens. Por vezes, a montagem acelera, aqui e ali há um efeito certo e eficaz (o barco que leva os escravos, trajecto que é visto através das rodas que fazem avançar a embarcação, por exemplo, ou o travelling vertical que sobe da cave onde se encontram os prisioneiro, até se descobrir o outro lado de Washington). Mas o essencial de “12 Anos Escravo” é “mostrar” para o espectador ter a liberdade de perceber por si próprio, tirar as conclusões sem dirigismos constrangedores.
Produzido entre outros por Steve McQueen e Brad Pitt, tudo em “12 Years a Slave” parece perfeito, imaginado e concretizado como não pudesse ser de outra forma. Adam Stockhausen, David Stein, Alice Baker e Patricia Norris assinam direcção artística, decoração e guarda-roupa com um requinte e cuidado extremos; a fotografia de Sean Bobbitt é notável, assim como a brilhante montagem de Joe Walker e a inspirada partitura musical de Hans Zimmer. Na interpretação, raras vezes se encontra um elenco com tamanho talento, sobriedade e fulgor. Chiwetel Ejiofor, Michael Fassbender, Benedict Cumberbatch, Paul Dano, Paul Giamatti, Lupita Nyong'o, Sarah Paulson ou Brad Pitt são simplesmente brilhantes, fazendo de “12 Anos Escravo” uma obra-prima que brilhou na noite nos Oscars.


12 ANOS ESCRAVO
Título original: 12 Years a Slave
Realização: Steve McQueen (EUA, 2013); Argumento: John Ridley, segundo obra de Solomon Northup ("Twelve Years a Slave"); Produção:  Dede Gardner, Anthony Katagas, Jeremy Kleiner, Steve McQueen, Arnon Milchan, Brad Pitt, Bill Pohlad, John Ridley, Tessa Ross; Música: Hans Zimmer; Fotografia (cor): Sean Bobbitt; Montagem: Joe Walker; Casting: Francine Maisler; Design de produção: Adam Stockhausen; Direcção artística:  David Stein; Decoração:  Alice Baker; Guarda-roupa: Patricia Norris; Maquilhagem: Ma Kalaadevi Ananda, Nana Fischer, Adruitha Lee; Direcção de Produção:  Alissa M. Kantrow, Alissa M. Kantrow; Assistentes de realização: Doug Torres, Mark Carter, Nathan Parker, James Roque, Ann C. Salzer, Sherman Shelton Jr.; Departamento de arte: Carl Counts, Matthew Gatlin, David Rotondo, Walter Schneider, Jim Wallis; Som: Ryan Collins, Jesse Ehredt, Kirk Francis, Robert Jackson, Robert Jackson, Tim Limer, Jordan O'Neill; Efeitos especiais: David Nash; Efeitos visuais: Elbert Irving IV, Chris LeDoux, Katie McCall, Dottie Starling; Companhias de produção: Regency Enterprises, River Road Entertainment, Plan B Entertainment, New Regency Pictures, Film4, Regency Enterprises; Intérpretes: Chiwetel Ejiofor (Solomon Northup), Michael Fassbender (Edwin Epps), Benedict Cumberbatch (William Ford), Paul Dano (John Tibeats), Paul Giamatti (Theophilus Freeman), Lupita Nyong'o (Patsey), Brad Pitt (Samuel Bass), Alfre Woodard (Harriet Shaw), Sarah Paulson (Mary Epps), Quvenzhané Wallis (Margaret Northup), Dwight Henry (Tio Abram), Michael K. Williams (Robert), Garret Dillahunt (Armsby), Scoot McNairy (Brown), Ruth Negga (Celeste), Adepero Oduye (Eliza), Chris Chalk (Clemens Ray), Christopher Berry (James Burch), Taran Killam (Hamilton), Dickie Gravois, Bryan Batt, Ashley Dyke, Kelsey Scott, Cameron Zeigler, Tony Bentley, Bill Camp, Mister Mackey Jr., Craig Tate, Storm Reid, Tom Proctor, Marc Macaulay, Vivian Fleming-Alvarez, Douglas M. Griffin, John McConnell, Marcus Lyle Brown, Richard Holden, Rob Steinberg, Anwan Glover, James C. Victor, Liza J. Bennett, Nicole Collins, J.D. Evermore, Andy Dylan, Deneen Tyler, Mustafa Harris, Gregory Bright, Austin Purnell, Thomas Francis Murphy, Andre De'Sean Shanks, Kelvin Harrison, Scott Michael Jefferson, Alfre Woodard, Isaiah Jackson, Garret Dillahunt, Topsy Chapman, Devin Maurice Evans, Jay Huguley, Devyn A. Tyler, Willo Jean-Baptiste, etc. Duração: 134 minutos; Distribuição em Portugal: Zon Lusomundo; Classificação etária: M/ 16 anos; Data de estreia em Portugal: 2 de Janeiro de 2014.

sábado, 6 de maio de 2017

10 DE MAIO: DR. ESTRANHO AMOR


DOUTOR ESTRANHOAMOR (1964)  
 DOUTOR ESTRANHOAMOR (1964)
Sob a fórmula de sátira que leva ao absurdo as consequências últimas da Guerra Fria, “Doutor EstranhoAmor” alerta-nos para os perigos de um desastre nuclear, pondo a descoberto os índices de falibilidade das medidas de segurança utilizadas, perante o gigantismo dos interesses económicos e da tecnologia bélica. Kubrick afirmou-o, aquando da estreia: “Trata-se de um filme que mostra um general louco que lança bombardeiros atómicos sobre um país adversário. A partir daí o mundo começa a levar as coisas a sério, só que é um pouco tarde.”
“Dr. Strangelove or: How I Learned to Stop Worrying and Love the Bomb”, com argumento de Stanley Kubrick, Terry Southern, Peter George, segundo romance de Peter George (“Red Alert”, ou “Two Hours to Doom”) vê a sua acção polarizada em três cenários diferentes, mas convergentes nas suas acções que se interpenetram, numa montagem em paralelo: uma base militar norte-americana, isolada, onde se encontra um general enlouquecido; a sala redonda do Pentágono, onde o presidente dos Estados Unidos e os seus conselheiros políticos e militares tentam remediar a sabotagem; o interior de um bombardeiro que depois de ter recebido ordens para dar cumprimento ao plano de “ataque R”, se precipita para o interior da União Soviética, com a finalidade de destruir objectivos militares. Da conjugação das situações nestes três locais nasce o suspense desta obra de humor corrosivo, brilhantemente interpretada por Sterling Hayden (o brigadeiro Jack D. Ripper, um perigoso belicista louco), Peter Sellers (compondo três personagens: capitão Lionel Mandrake, adjunto de Jack D. Ripper, Merkin Muffley, presidente dos EUA e Dr.Stangelove, um técnico alemão, meio robot, com um teimoso braço direito que não se cansa de se projectar para a frente, numa clara saudação nazi), George C. Scott (general 'Buck' Turgidson), Keenan Wynn (coronel 'Bat' Guano) ou Slim Pickens (major T.J. 'King' Kong).


Este filme integra-se numa corrente de ficção política que na década de 60 teve várias obras de idênticas intenções, nomeadamente “Sete Dias em Maio”, de John Frankenheim, e “Missão Suicida”, de James B. Harris, até então produtor de Stanley Kubrick, e que com essa realização se emancipava como director, iniciando uma nova carreira. Mas este filme de Kubrick é claramente superior às outras obras (muito embora a evidente qualidade de ambas), e isso deve-se à magnífica realização deste cineasta, e sobretudo ao tom de humor escolhido. Kubrick não perde uma oportunidade para sublinhar um efeito de sátira: o piloto do bombardeiro norte-americano lança-se sobre terra russa, cavalgando uma bomba nuclear, tal como um vulgar cowboy de tempos heroicos; toda a carga simbólica de personagens como o brigadeiro louco (e a sua teoria da ameaça bolchevista: a degenerescência dos fluídos corpóreos!); o próprio Dr. Stangelove; a crítica ostensiva ao militarismo de um inconsciente general Buck Turgidson, que, depois de desencadeada a crise, já com os bombardeiros a caminho da URSS, justifica o aproveitamento desta decisão, com a explicação de que uma tal ocorrência apanharia os soviéticos desprevenidos e permitiria acabar com o seu poderio, “com um mínimo de perdas humanas, qualquer coisa como apenas 120 milhões de soviéticos e 20 milhões de americanos”; ou ainda o fabuloso bailado final, quando sucessivas explosões nucleares se fundem num apocalíptico cogumelo de destruição, tendo como banda sonora uma romântica valsa (sequência que está certamente na origem de certas ideias de sonoplastia desenvolvidas depois em 2001).
Um filme brilhante, de um homem desencantado e corrosivo quanto ao futuro do Homem. Um futuro que Kubrick irá antever sob uma perspectiva inteiramente nova, no filme seguinte, a sua primeira incursão no campo da ficção científica, “2001: Odisseia no Espaço”.


DR. STRANGELOVE
Título original: Dr. Strangelove or: How I Learned to Stop Worrying and Love the Bomb
Realização: Stanley Kubrick (Inglaterra, 1964); Argumento: Stanley Kubrick, Terry Southern, Peter George, segundo romance de Peter George (“Red Alert”, ou “Two Hours to Doom”); Música: Laurie Johnson; Fotografia (p/b):  Gilbert Taylor; Montagem: Anthony Harvey; Design de produção: Ken Adam; Direcção artística: Peter Murton; Maquilhagem: Stuart Freeborn, Barbara Ritchie; Direcção de produção: Clifton Brandon; Assistentes de realização: Eric Rattray; Som: John Aldred, Richard Bird, John Cox, Leslie Hodgson; Efeitos Especiais: Wally Veevers, Alan Bryce, Arthur 'Weegee' Fellig, Brian Gamby, Garth Inns, Mike Shaw; Efeitos visuais: Vic Margutti; Produção: Stanley Kubrick, Victor Lyndon, Leon Minoff.; Intérpretes: Peter Sellers (Capitão Lionel Mandrake/Presidente Merkin Muffley/Dr. Strangelove), George C. Scott (General 'Buck' Turgidson), Sterling Hayden (Brigadeiro Jack D. Ripper), Keenan Wynn (Coronel 'Bat' Guano), Slim Pickens (Major T.J. 'King' Kong), Peter Bull (Embaixador soviético Alexi de Sadesky), James Earl Jones (Tenente Lothar Zogg), Tracy Reed (Miss Scott), Jack Creley (Mr. Staines), Frank Berry (Tenente  H.R. Dietrich), Robert O'Neil (Almirante Randolph), Glenn Beck (Tenente  W.D. Kivel), Roy Stephens (Frank), Shane Rimmer (Capitão G.A. 'Ace' Owens), Paul Tamarin (Tenente  B. Goldberg), Gordon Tanner (General Faceman), John McCarthy, Hal Galili, Laurence Herder, etc. Duração: 93 minutos; Distribuição em Portugal: Columbia Filmes; Classificação etária: M/ 12 anos; Estreia em Portugal: 25 de Julho de 1974.