DOUTOR ESTRANHOAMOR (1964)
DOUTOR
ESTRANHOAMOR (1964)
Sob a fórmula de
sátira que leva ao absurdo as consequências últimas da Guerra Fria, “Doutor
EstranhoAmor” alerta-nos para os perigos de um desastre nuclear, pondo a
descoberto os índices de falibilidade das medidas de segurança utilizadas,
perante o gigantismo dos interesses económicos e da tecnologia bélica. Kubrick
afirmou-o, aquando da estreia: “Trata-se de um filme que mostra um general
louco que lança bombardeiros atómicos sobre um país adversário. A partir daí o
mundo começa a levar as coisas a sério, só que é um pouco tarde.”
“Dr. Strangelove or: How I Learned to
Stop Worrying and Love the Bomb”, com argumento de Stanley Kubrick, Terry
Southern, Peter George, segundo romance de Peter George (“Red Alert”, ou “Two
Hours to Doom”) vê a sua acção polarizada em três cenários diferentes, mas
convergentes nas suas acções que se interpenetram, numa montagem em paralelo:
uma base militar norte-americana, isolada, onde se encontra um general
enlouquecido; a sala redonda do Pentágono, onde o presidente dos Estados Unidos
e os seus conselheiros políticos e militares tentam remediar a sabotagem; o
interior de um bombardeiro que depois de ter recebido ordens para dar
cumprimento ao plano de “ataque R”, se precipita para o interior da União
Soviética, com a finalidade de destruir objectivos militares. Da conjugação das
situações nestes três locais nasce o suspense desta obra de humor corrosivo,
brilhantemente interpretada por Sterling Hayden (o brigadeiro Jack D. Ripper,
um perigoso belicista louco), Peter Sellers (compondo três personagens: capitão
Lionel Mandrake, adjunto de Jack D. Ripper, Merkin Muffley, presidente dos EUA
e Dr.Stangelove, um técnico alemão, meio robot, com um teimoso braço direito
que não se cansa de se projectar para a frente, numa clara saudação nazi),
George C. Scott (general 'Buck' Turgidson), Keenan Wynn (coronel 'Bat' Guano)
ou Slim Pickens (major T.J. 'King' Kong).
Este filme integra-se numa corrente de
ficção política que na década de 60 teve várias obras de idênticas intenções,
nomeadamente “Sete Dias em Maio”, de John Frankenheim, e “Missão Suicida”, de
James B. Harris, até então produtor de Stanley Kubrick, e que com essa
realização se emancipava como director, iniciando uma nova carreira. Mas este
filme de Kubrick é claramente superior às outras obras (muito embora a evidente
qualidade de ambas), e isso deve-se à magnífica realização deste cineasta, e
sobretudo ao tom de humor escolhido. Kubrick não perde uma oportunidade para
sublinhar um efeito de sátira: o piloto do bombardeiro norte-americano lança-se
sobre terra russa, cavalgando uma bomba nuclear, tal como um vulgar cowboy de
tempos heroicos; toda a carga simbólica de personagens como o brigadeiro louco
(e a sua teoria da ameaça bolchevista: a degenerescência dos fluídos
corpóreos!); o próprio Dr. Stangelove; a crítica ostensiva ao militarismo de um
inconsciente general Buck Turgidson, que, depois de desencadeada a crise, já
com os bombardeiros a caminho da URSS, justifica o aproveitamento desta
decisão, com a explicação de que uma tal ocorrência apanharia os soviéticos
desprevenidos e permitiria acabar com o seu poderio, “com um mínimo de perdas
humanas, qualquer coisa como apenas 120 milhões de soviéticos e 20 milhões de
americanos”; ou ainda o fabuloso bailado final, quando sucessivas explosões
nucleares se fundem num apocalíptico cogumelo de destruição, tendo como banda
sonora uma romântica valsa (sequência que está certamente na origem de certas
ideias de sonoplastia desenvolvidas depois em 2001).
Um filme brilhante, de um homem
desencantado e corrosivo quanto ao futuro do Homem. Um futuro que Kubrick irá
antever sob uma perspectiva inteiramente nova, no filme seguinte, a sua
primeira incursão no campo da ficção científica, “2001: Odisseia no Espaço”.
DR.
STRANGELOVE
Título
original: Dr. Strangelove or: How I Learned to Stop Worrying and Love the Bomb
Realização:
Stanley Kubrick (Inglaterra, 1964); Argumento: Stanley Kubrick, Terry Southern,
Peter George, segundo romance de Peter George (“Red Alert”, ou “Two Hours to
Doom”); Música: Laurie Johnson; Fotografia (p/b): Gilbert Taylor; Montagem: Anthony Harvey;
Design de produção: Ken Adam; Direcção artística: Peter Murton; Maquilhagem:
Stuart Freeborn, Barbara Ritchie; Direcção de produção: Clifton Brandon;
Assistentes de realização: Eric Rattray; Som: John Aldred, Richard Bird, John
Cox, Leslie Hodgson; Efeitos Especiais: Wally Veevers, Alan Bryce, Arthur
'Weegee' Fellig, Brian Gamby, Garth Inns, Mike Shaw; Efeitos visuais: Vic
Margutti; Produção: Stanley Kubrick, Victor Lyndon, Leon Minoff.; Intérpretes: Peter Sellers (Capitão
Lionel Mandrake/Presidente Merkin Muffley/Dr. Strangelove), George C. Scott
(General 'Buck' Turgidson), Sterling Hayden (Brigadeiro Jack D. Ripper), Keenan
Wynn (Coronel 'Bat' Guano), Slim Pickens (Major T.J. 'King' Kong), Peter Bull
(Embaixador soviético Alexi de Sadesky), James Earl Jones (Tenente Lothar
Zogg), Tracy Reed (Miss Scott), Jack Creley (Mr. Staines), Frank Berry
(Tenente H.R. Dietrich), Robert O'Neil
(Almirante Randolph), Glenn Beck (Tenente
W.D. Kivel), Roy Stephens (Frank), Shane Rimmer (Capitão G.A. 'Ace'
Owens), Paul Tamarin (Tenente B.
Goldberg), Gordon Tanner (General Faceman), John McCarthy, Hal Galili, Laurence
Herder, etc. Duração: 93 minutos; Distribuição em Portugal: Columbia Filmes; Classificação
etária: M/ 12 anos; Estreia em Portugal: 25 de Julho de 1974.
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